Saulo de Tarso havia sido abandonado pelos amigos e pelo próprio pai após afirmar que era seguidor de Cristo Jesus. Estava só no mundo e pôs-se a dormir sob uma árvore. Em seguida, teve um sonho com a amada noiva, Abigail, que falecera meses antes…
“O ex-rabino (Saulo) desejaria prolongar a deliciosa visão para o resto da vida, manter-se junto dela para sempre; contudo, a entidade querida esboçava um gesto amoroso de adeus. Esforçou-se, então, por catalogar apressadamente suas necessidades espirituais, desejoso de ouvi-la relativamente aos problemas que o defrontavam. Ansioso de aproveitar as mínimas parcelas daquele glorioso, fugaz minuto, Saulo alinhava mentalmente grande número de perguntas. Que fazer para adquirir a compreensão perfeita dos desígnios do Cristo?
- Ama! – respondeu Abigail espontaneamente.
Mas como proceder de modo a enriquecermos na virtude divina? Jesus aconselha o amor aos próprios inimigos. Entretanto, considerava quão difícil deveria ser semelhante realização. Penoso testemunhar dedicação, sem o real entendimento dos outros. Como fazer para que a alma alcançasse tão elevada expressão de esforço com Jesus-Cristo?
- Trabalha! – esclareceu a noiva amada, sorrindo bondosamente.
Abigail tinha razão. Era necessário realizar a obra do aperfeiçoamento interior. Desejava ardentemente fazê-lo. Para isso insulara-se no deserto, por mais de mil dias consecutivos. Todavia, voltando ao ambiente do esforço coletivo, em cooperação com antigos companheiros, acalentava sadias esperanças que se converteram em dolorosas perplexidades. Que providência adotar contra o desânimo destruidor?
-Espera! – disse ela, ainda num gesto de terna solicitude, como quem desejava esclarecer que a alma deve estar pronta a atender ao programa divino em qualquer circunstância, extreme de caprichos pessoais.
Ouvindo-a, Saulo considerou que a esperança fora sempre a companheira dos seus dias mais ásperos. Saberia aguardar o porvir com as bênçãos do Altíssimo. Confiaria na sua miserircódia. Não desdenharia as oportunidades do serviço redentor. Mas… os homens? Em toda parte medrava a confusão nos espíritos. Reconhecia que, de fato, a concordância geral em torno dos ensinamentos do Mestre Divino representava uma realização das mais difíceis, no desdobramento do evangelho; mas, além disso, as criaturas pareciam igualmente desinteressadas da verdade e da luz. … Como conciliar as grandiosas lições do Evangelho com a indiferença dos homens?
Abigail apertou-lhe as mãos com mais ternura a indicar as despedidas, e acentuou docemente:
-Perdoa!…
Em seguida, seu vulto luminoso pareceu diluir-se como se fosse feito de fragmentos de aurora.
…
Experimentando uma paz até então desconhecida, Saulo acreditou que renascia naquele momento para uma existência muito diversa. Singular serenidade tocava-lhe o espírito. Uma compreensão diferente felicitava-o para o reinício da jornada no mundo. Guardaria o lema de Abigail, para sempre. O amor, o trabalho, a esperança e o perdão seriam seus companheiros inseparáveis. Cheio de dedicação por todos os seres, aguardaria as oportunidades que Jesus lhe concedesse, abstendo-se de provocar situações, e, nesse ponto, saberia tolerar a ignorância ou a fraqueza alheias, ciente de que também ele carregava um passado condenável, que, nada obstante, merecera a compaixão do Cristo.
Paulo e Estêvão, Emmanuel – Chico Xavier
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